sábado, 19 de novembro de 2022

TRT-PR anula condenação de trabalhador que, por falta de acesso, faltou a audiência telepresencial

 Um trabalhador que faltou à audiência por videoconferência e recebeu a pena de confissão conseguiu que o Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (TRT-PR) anulasse a audiência e todos os atos processuais que se seguiram a ela. O TRT-PR acatou o argumento do autor, que justificou a ausência por não possuir os meios técnicos para acessar a audiência, ainda que tenha optado, ao ajuizar a ação, pelo “Juízo 100% Digital”. A 7ª Turma do TRT-PR, que julgou o caso, destacou que realizar audiência por videoconferência quando a parte informa expressamente não ter estrutura tecnológica para acessar a plataforma “não se compadece com os direitos fundamentais de acesso à Justiça e da ampla defesa”. A 7ª Turma determinou que a vara do trabalho de origem realize nova audiência.

O trabalhador ajuizou ação em julho de 2021, optando pelo “Juízo 100% Digital”, um sistema que permite que todos os atos processuais sejam feitos por meio digital, inclusive audiências. Mas as duas rés, empresas de telecomunicações, discordaram da opção do reclamante. Automaticamente, o PJe gerou uma certidão informando que o processo não tramitaria na modalidade 100% digital.

Em 18 fevereiro de 2022, a vara do trabalho intimou as partes, informando que a audiência de instrução seria por videoconferência e estaria marcada para o dia 16 de março. Mas, na véspera da audiência, o trabalhador alegou que não tinha condições técnicas para acessar a plataforma Zoom, na qual ocorrem as audiências por videoconferência, e requereu que a sessão fosse convertida para a modalidade presencial.

O Juízo, entretanto, manteve a realização da audiência virtual, destacando que o autor deveria ter se manifestado com maior antecedência. Frisou, ainda, que o sistema é extremamente intuitivo, não havendo qualquer dificuldade de operação, especialmente considerado o estágio de informatização do mundo atual, além de que eventuais dificuldades técnicas, como interrupções de serviço, queda de conexão da internet, problemas de áudio ou microfone, que dificultassem ou impedissem a participação das partes, testemunhas ou advogados poderiam ser objeto de análise do Juízo.

A audiência foi realizada sem o trabalhador, e sua ausência foi considerada injustificada. Na sentença, foi decretada a confissão da parte autora quanto à matéria de fato (Súmula 74 do C. TST), com presunção relativa de veracidade das alegações da parte adversa (arts. 844 e 319 do CPC).

O trabalhador apresentou recurso, contestando a decisão de primeiro grau.

A 7ª Turma do TRT-PR, julgadora do recurso, acolheu o pedido do autor. O Colegiado explicou que a audiência telepresencial visa possibilitar a continuidade da prestação jurisdicional. Dessa forma, diante da dificuldade técnica ou impossibilidade da parte em acessar a plataforma digital, o que foi informado expressamente pelo trabalhador, a realização da audiência por vídeoconferência desencadeia “o malferimento dos direitos fundamentais de acesso à Justiça do autor, como também o da ampla defesa”, afirmou a relatora do acórdão, desembargadora Rosemarie Diedrichs Pimpão.

A relatora salientou, ainda, que a opção do autor, quando do ajuizamento da ação, pelo "Juízo 100% Digital" não invalida a sua justificativa de falta à audiência, uma vez que ambas as reclamadas recusaram o modelo 100% digital, resultando na expedição da certidão automática nos autos, atestando que: "Esse processo não observará as diretrizes previstas em referida Resolução". (Resolução CNJ nº 345/2020, que dispõe sobre o “Juízo 100% Digital”).

“No presente caso, fica evidenciado o prejuízo sofrido pelo autor, que teve contra si aplicada a confissão ficta. Nesse contexto, entende-se caracterizado o cerceamento de defesa”, finalizou a relatora.

A desembargadora declarou a nulidade dos atos processuais a partir da audiência telepresencial realizada em 16 de março e determinou o retorno dos autos ao Juízo de origem para designação de nova audiência.

O caso descrito refere-se ao processo nº 0000579-78.2021.5.09.0084.

Confira abaixo a ementa do acórdão:

AUDIÊNCIA POR VIDEOCONFERÊNCIA. PARTE QUE NÃO DISPÕE DE MEIOS TÉCNICOS PARA ACESSO. ACESSO À JUSTIÇA E AMPLA DEFESA. ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO. RESOLUÇÃO Nº 314, ART. 6º, §§ 1º E 3º DO CNJ. Realizar audiência por videoconferência quando a parte expressamente informa que não possui os meios técnicos para acessá-la não se compadece com os direitos fundamentais de acesso à Justiça e da ampla defesa. Inteligência dos arts. 5º, LV da Constituição e 6º, §§ 1º e 3º da Resolução nº 314 do CNJ. Nulidade reconhecida. Recurso do autor a que se dá provimento.


Fonte: TRT 9 Região.

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Banco é condenado por não comunicar acidentes de trabalho ao INSS

 11/11/22 - A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou examinar recurso do Banco Santander (Brasil) S.A. contra decisão que o condenou a pagar R$ 500 mil por não emitir Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT) no Estado da Paraíba. Para o colegiado, o valor da indenização é razoável e está dentro do patamar médio estabelecido pelo TST em casos semelhantes. 

Recusa

A CAT é um documento emitido para reconhecer um acidente de trabalho ou uma doença ocupacional. Segundo o artigo 22 da Lei 8.213/1991, que trata dos Planos de Benefícios da Previdência Social, a comunicação deve ser feita pelo empregador à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte à ocorrência e, em caso de morte, de imediato, sob pena de multa. 

Na ação civil pública, ajuizada em 2014, o Sindicato dos Trabalhadores em Empresas do Ramo Financeiro no Estado da Paraíba sustentou que o Santander havia se recusado a emitir a CAT inúmeras vezes, obrigando os empregados a acioná-lo para o encaminhamento para perícia no INSS. De acordo com a entidade, a recusa na emissão do documento dificulta a concessão do benefício. 

Dano coletivo

O pedido foi julgado procedente pelo juízo de primeiro grau, que condenou a empresa a emitir a CAT nos moldes da lei e a não dispensar empregados afastados pela Previdência, além de pagar R$ 800 mil por dano moral coletivo.

O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB) manteve a condenação, mas reduziu o valor de R$ 800 mil para R$ 500 mil. Segundo o TRT, as provas demonstraram que as diversas CATs emitidas pelo sindicato representam a quase totalidade dos 54 acidentes noticiados pelo INSS no período, configurando a omissão do empregador quanto ao dever legal de emiti-las. 

Omissão e negligência

Segundo o relator do agravo pelo qual o Santander pretendia rediscutir o processo no TST, ministro Mauricio Godinho Delgado, a comprovação da omissão e da negligência do banco evidenciou o efetivo prejuízo gerado aos trabalhadores. Ele explicou que a emissão do documento é extremamente importante para o controle do Poder Executivo sobre o cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho e, consequentemente, para a prevenção de acidentes. A medida também é relevante para facilitar a concessão de benefícios previdenciários em caso de doenças incapacitantes. 

Ainda segundo o ministro, as condutas da empresa, “de fato, causaram dano moral de ordem coletiva. 

Valor

Quanto ao montante da indenização, o relator salientou que, diante da gravidade e da repetição das condutas lesivas, do bem jurídico atingido e da capacidade econômica do empregador, entre outros aspectos, o valor de R$ 500 mil é razoável e está dentro do patamar médio estabelecido pelo TST em casos semelhantes.

(LT/CF)

Processo: AIRR-54600-83.2014.5.13.0004


Fonte: TST

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Dispensa de consultora por briga entre marido e empregador é enquadrada como discriminação de gênero

 07/11/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a WCC Fitness Academia de Ginástica, microempresa de Taguatinga (DF), a indenizar uma consultora de vendas dispensada após um desentendimento entre seu marido, ex-gerente do local, e um dos sócios da empresa. Para o colegiado, ao ter sido dispensada sem ter praticado nenhum ato que justificasse a medida, a trabalhadora foi considerada mera extensão do homem, caracterizando discriminação de gênero.

WhatsApp

A consultora foi admitida em janeiro de 2016, e, no mês seguinte, seu marido foi contratado como gerente geral da academia. Porém, apenas cinco meses depois, ele saiu da empresa, após se desentender seriamente com um dos sócios. Em seguida, a trabalhadora foi demitida sumariamente, por meio de mensagem de WhatsApp enviada ao marido. Nas mensagens, o empresário escreveu: “E sua mulher não precisa ir a partir de amanhã também mais não. Está demitida. Não quero contato algum com esse tipo de gente”. 

Alegando despedida injusta e assédio moral, a consultora ajuizou reclamação trabalhista em que pediu o pagamento de indenização reparatória com base na discriminação.

A academia, em sua defesa, negou que a dispensa tivesse sido motivada por retaliação e questionou a veracidade da troca de mensagens.

Prova ilícita

O pedido foi negado pelo juízo da 13ª Vara do Trabalho de Brasília (DF), que considerou ilícita a conversa de WhatsApp entre o marido e o sócio como prova, porque a consultora não havia participado dela. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região manteve a sentença, por entender que a dispensa se dera dentro do poder diretivo da empresa.

Recado

Para a relatora do recurso de revista, ministra Delaíde Miranda Arantes, a trabalhadora foi claramente despedida por retaliação e discriminação. “Ela foi dispensada por meio de um recado”, observou. “O empregador refere-se à mulher trabalhadora, sua empregada, e ao seu marido de forma depreciativa e discriminatória, o que nem de longe se insere no seu poder diretivo”. 

Identidade

A ministra assinalou, também, que a dispensa demonstra total desconsideração à mulher, ignorando a sua identidade, seus direitos e seus atributos enquanto trabalhadora. “A atitude patronal busca atingir ao mesmo tempo o marido e a mulher, o que atinge também a sociedade e demonstra clara discriminação de gênero”, afirmou.  

Perspectiva de gênero

Em seu voto, a relatora observou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero 2021, orientou o Poder Judiciário a ficar atento e não minimizar a relevância de certas provas com base em uma ideia preconcebida sobre gênero. O documento recomenda ao julgador “refletir sobre prejuízos potencialmente causados” e “incorporar essas considerações em sua atuação jurisdicional”, considerando, ainda, se existe “alguma assimetria entre as partes envolvidas”. 

Outro fundamento da decisão foi a Lei 9.029/1995, que proíbe qualquer prática discriminatória no ambiente de trabalho por motivo de sexo, estado civil e situação familiar, entre outros. No caso concreto, a consultora, enquanto mulher, “foi considerada mera extensão do homem, o que denota a indubitável prática de ato discriminatório”. 

Indenização

Ao estabelecer a condenação, a ministra também se baseou na Lei 9.029/1995, que faculta à empregada escolher entre a reintegração no emprego ou a indenização correspondente ao período de afastamento, em dobro. No caso, a consultora havia pedido expressamente a indenização. O valor deve ser calculado considerando o período entre a dispensa e a primeira decisão judicial que reconheceu a sua ilicitude, acrescidos de R$ 5 mil a título de danos morais.

Ficou vencido o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, que entendia indevida a indenização postulada. 

(Glauco Luz e Carmem Feijó/CF)
     
Processo: RR-228-39.2017.5.10.0013

sábado, 5 de novembro de 2022

Analista de TI poderá trabalhar da Itália para acompanhar filho autista

 04/11/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso do Instituto de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado do Espírito Santo (Prodest) contra decisão que autorizou regime de teletrabalho a um analista de tecnologia da informação. Ele tem um filho autista que mora na Itália com a mãe, que está muito doente e não pode cuidar da criança. A decisão segue diversos precedentes do TST e se fundamenta na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Pedido indeferido

Na reclamação trabalhista, o analista relatou que seu filho, de 29 anos, tem Transtorno do Espectro Autista em grau elevado e, por isso, precisa de cuidados permanentes para atividades básicas. Por razões de tratamento e de qualidade de vida, o rapaz mora com a mãe na Itália, e o pai os visita sempre que possível.

Ocorre que a mãe passou a sofrer de diverticulose no cólon e depressão, e sua condição a impede de prestar os cuidados ao filho. Em setembro de 2018, com o agravamento da saúde da esposa, o analista pediu que fosse autorizado a trabalhar remotamente enquanto perdurasse o tratamento, mas a Prodest indeferiu o pedido.

Segundo a empresa, as atividades desenvolvidas por ele seriam incompatíveis com o teletrabalho e não havia base legal para o teletrabalho no exterior.

Compatibilidade

O juízo de primeiro grau também julgou improcedente a pretensão, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) reformou a sentença e reconheceu o direito do analista ao teletrabalho pelo prazo inicial de seis meses. Segundo o TRT, a atividade de desenvolvimento de sistemas de informação, realizada por ele, não exige sua presença física e é plenamente compatível com a prestação do serviço a distância. De acordo com a decisão, o empregado arcaria com os custos da infraestrutura necessária. 

Adaptação razoável

O ministro Agra Belmonte foi o relator do agravo com o qual o Prodest pretendia rediscutir o caso no TST. Ele destacou que, de acordo com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), chancelada pelo Decreto Legislativo 186/2008, prevê o compromisso do Estado de fazer todo o esforço para que a família imediata tenha condições de cuidar de uma pessoa com deficiência. Entre as formas de conseguir isso está a "adaptação razoável”, modificações e ajustes necessários que não acarretem ônus desproporcional ou indevido para assegurar que essas pessoas possam exercer todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. 

No caso, para que o filho possa ser acompanhado pelo pai, diante da gravidade da doença da mãe, é necessário adaptar a prestação de serviços à modalidade remota, uma vez constatada sua plena compatibilidade com as atividades executadas pelo analista. 

Mútuo acordo

Agra Belmonte assinalou que, conforme a CLT (artigo 75-c, parágrafo 1º), a mudança do regime presencial para o teletrabalho poderá ser realizada desde que “haja mútuo acordo entre as partes”. A seu ver, porém, essa norma deve ser interpretada em associação aos demais preceitos contidos no ordenamento jurídico, em especial os que concretizam os direitos fundamentais necessários à existência digna da pessoa com deficiência.

A decisão foi unânime.

(Lourdes Tavares/CF)

Processo: AIRR-1208-69.2018.5.17.0008

Fonte: TST

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  31/7/2024 - A Vale S.A. deverá manter o salário de um técnico em eletromecânica que entrou em auxílio-doença sem relação com trabalho dura...